05/04/2024

STF isenta empresas de multas e reduz impacto do julgamento sobre ‘quebra’ de decisões definitivas

Por: Beatriz Olivon
Fonte: Valor Econômico
Os contribuintes conseguiram nesta quinta-feira, no Supremo Tribunal Federal
(STF), reduzir o impacto bilionário da decisão que permitiu a “quebra” de
sentenças definitivas — a chamada “coisa julgada”. Apesar de os ministros
não terem aceitado o pedido de modulação de efeitos, para que o
entendimento fosse aplicado apenas para o futuro e, assim, evitar cobranças
retroativas de tributos, decidiram que, em relação ao caso analisado, que
envolve a CSLL, as dívidas podem ser pagas sem as multas punitivas e de
mora.
Para advogados, a retirada das multas é uma vitória e o precedente pode ser
utilizado pelos contribuintes para tentarem obter o mesmo benefício em outras
discussões tributárias. A decisão foi dada em recursos (embargos de declaração)
contra o entendimento adotado em fevereiro de 2023 pelo ministros (RE
955227 e RE 949297).
No mérito, ficou definido que sentenças tributárias dadas como definitivas
deixam de ter efeito sempre que houver um julgamento posterior do STF em
sentido contrário (RE 955227 e RE 949297). Antes a “quebra” não ocorria de
forma automática. O Fisco podia pleitear a reversão, mas por meio de um
instrumento específico, a chamada ação rescisória — que tem prazo de até dois
anos para ser utilizada e pode ou não ser aceita pelo Judiciário.
No caso da CSLL, a cobrança foi declarada constitucional pelo Supremo no
ano de 2007. No julgamento agora, as empresas pediram, então, para que a
decisão só tivesse validade a partir de 2023, não retroagindo a 2007.
No caso concreto, o impacto seria de R$ 7,23 bilhões. O valor envolve 24
empresas afetadas pela “quebra” de decisões que obtiveram contra o
pagamento de CSLL. Com a retirada das multas, essa conta cai em pelo menos
R$ 1 bilhão, segundo informou, na retomada do julgamento, o ministro Gilmar
Mendes.
O relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, citou, no julgamento, que
um dos casos analisados é da Braskem, que teria se manifestado de forma que
relativizou o impacto da decisão de mérito. Nos recursos (embargos), os
contribuintes afirmam que o entendimento adotado em 2023 provocaria um
rombo de bilhões de reais no caixa das companhias.
“Logo que nós julgamos teve uma notícia que as empresas iriam quebrar, mas
a própria Braskem, em fato relevante, informou que não, que ela tinha
provisionado esses recursos. Como acho que qualquer advogado deveria ter
indicado a seu cliente”, afirmou Barroso.
Na sessão, o pedido de modulação foi negado por maioria de votos. Prevaleceu
o voto do ministro Luís Roberto Barroso, que negou os recursos (embargos de
declaração), mantendo a decisão original. Votaram nesse sentido os ministros
Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa
Weber.
Sobre as multas, prevaleceu o voto do ministro André Mendonça. Ele
considerou ser possível a retirada para os contribuintes com decisão judicial a
seu favor. Para ele, não teria havido, nesses casos, dolo ou má-fé. O
entendimento dele foi seguido pelos ministros Luís Roberto Barroso, Nunes
Marques, Dias Toffoli, Edson Fachin e Luiz Fux.
Análise
Além da CSLL, outras teses tributárias, segundo advogados tributaristas, podem
ser afetadas pela “quebra da coisa julgada”. Citam, como exemplos, as
discussões sobre o terço constitucional de férias e IPI na saída do
estabelecimento importador.
Pela decisão, a exclusão das multas vale apenas para as cobranças retroativas de
CSLL. Mas segundo a advogada Priscila Faricelli, sócia do Demarest
Advogados, há sinalização de que esse entendimento poderia ser aplicado em
outras situações. “Ainda que esse ponto não fique expresso na tese fixada,
certamente haverá argumentos para levar a orientação do STF para outras teses
julgadas em desfavor dos contribuintes”, afirmou.
Para Maria Andréia dos Santos, sócia do escritório Machado Associados, o que
ficou evidente, em todos os debates no julgamento, foi a preocupação dos
ministros em não chancelar a conduta do contribuinte que obteve, com decisão
contra o pagamento da CSLL, uma vantagem competitiva indevida por meio de
redução de carga tributária. Ficou claro, no julgamento, acrescenta, o reduzido
universo de empresas que se beneficiaram desse tipo de decisão.
“Apesar das manifestações de diversos ministros no sentido de que essa decisão
terá impacto em outras discussões, a maioria realmente votou considerando só
as particularidades desse caso [sobre CSLL], os longos intervalos de tempo em
que essas empresas teriam se beneficiado de uma carga tributária menor”, disse.
De acordo com Tércio Chiavassa, sócio do Pinheiro Neto Advogados, a decisão
melhora a situação para os contribuintes, mas ainda “é pouco” pelo que se
discutiu e pelo tema envolvido, já que as empresas estavam e ainda estão
inconformadas com o mérito da questão.
“Pelo menos é uma vitória [o afastamento das multas]. Mostra que as empresas
não estavam com má-fé, como alguns ministros alegaram. Não foi uma aposta
[não pagar o tributo]. Foi observância de uma decisão transitada em julgado”,
afirmou.
O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, comemorou
na rede social X (antigo Twitter) a decisão. Afirmou que o julgado tem impacto
estimado em R$ 6,23 bilhões apenas para o passado, sem contar os valores que
passarão a entrar no caixa do Tesouro porque as empresas pagarão a CSLL.
“Agora, esses contribuintes terão que pagar o tributo.”